A luta pelo
aprofundamento da democracia em nosso país vai exigir povo nas ruas novamente,
tal como aconteceu nas marchas de junho de 2013. Naquele histórico evento, uma
grande massa com múltiplos interesses e motivações foi para a avenida bradar
sua insatisfação. Foi a primeira vez, no período pós-ditadura militar, que uma
grande massa popular foi às ruas sem que este movimento tivesse passado de alguma
forma pelo crivo ou recebesse o apoio do Partido dos Trabalhadores. Daquela
amálgama não isenta de contradições e cheia de energia a ser direcionada
politicamente, acredito que se possa afirmar representar (1) um grande desejo
de uma nova geração em dar a sua contribuição para a dinâmica política da vida
nacional (parece haver uma insatisfação com a estrutura polarizada que a
política brasileira em nível federal na prática acabou tomando nos últimos 20
anos: PT versus PSDB); (2) uma insatisfação com os intermediários nos processos
fundamentais para a expressão da sociedade, seja no que diz respeito aos
problemas da chamada representação política, identificada como isolada do
conjunto da cidadania e articulada exclusivamente em torno de seus interesses imediatos,
seja em relação à mídia tradicional, claramente manifestada nas depredações e
pressões das multidões em marcha contra os grandes veículos de comunicação
(redes de TV, grandes jornais e revistas), vistos fundamentalmente como
manipuladores comprometidos com interesses que não coincidem com aqueles da
cidadania emancipada.
Nas eleições
de 2014, a candidatura do PT fez dois movimentos claros em sinalização às
demandas de 2013: a expedição do decreto da PNPS (Política Nacional de
Participação Social) e o compromisso de campanha com a realização de uma
reforma política por meio de uma constituinte exclusiva articulada com uma
consulta direta à população. Um plebiscito informal foi feito (com adesão de
mais de sete milhões de votantes, um número três milhões abaixo do último
plebiscito deste tipo feito quando o PT ainda era oposição em nível federal) e
a posse de Dilma implicava em uma expectativa de que o governo federal pudesse
impulsionar de modo eficiente esta demanda social de alta relevância. Ocorre que
neste entretempo a condução política do governo federal tem se caracterizado
como desastrosa. A pior das consequências até aqui foi a incrível derrota na
disputa pela presidência da Câmara dos Deputados, com a vitória do deputado
Eduardo Cunha, que apesar de integrar o PMDB se apresenta com perfil
independente em relação ao Palácio do Planalto, sendo político explicitamente
hostil a uma série de demandas populares que tinham a expectativa de se verem
concretizadas no que se convencionou chamar no ano passado de “reforma política”.
Para deixar
muito clara sua posição, Cunha nomeou de plano uma comissão especial da Câmara
presidida por ninguém menos que Rodrigo Maia, do Democratas. Sim, o Democratas,
um partido que é herdeiro direto de ARENA e PFL, partidos de sustentação da
ditadura militar. Um partido que caminha para a total irrelevância, em especial
depois de uma enorme debandada ocorrida na oportunista criação do PSD de
Gilberto Kassab, criado para ser um PMDB do B.
Toda e
qualquer proposta de aperfeiçoamento das instituições democráticas tem que
passar pelo Congresso Nacional. Com a vacilação ou mesmo impotência da
Presidência da República e a verdadeira hostilidade da direção da Câmara dos
Deputados diante de propostas de reforma política progressistas, só restará ao
cidadão indignado voltar às ruas para pressionar novamente as instituições no
sentido de impedir que a reforma política, longe de aperfeiçoar a democracia
que hoje temos, se converta em espaço de reiteração acentuada do fenômeno
intensamente repudiado nas manifestações de junho de 2013, qual seja, o da
autonomização dos interesses da classe política em face do restante da
população.
P.S.: nem vou comentar as Medidas Provisórias que atingiram direitos sociais. Sobre elas apenas espero que sejam derrotadas no Parlamento (quanto custa politicamente a um partido denominado “dos Trabalhadores” dar a oportunidade para Renan Calheiros afirmar que “não vai deixar que os trabalhadores paguem a conta do ajuste fiscal?”) ou no Judiciário. Seria um bom xarope para curar a inesperada tosse bovina.
Obs.: a gravura acima é um banner da candidatura vencedora no pleito de 2014.
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