São Fco.
segunda-feira, 8 de junho de 2015
Fogo no Paço e o governo dos vices
Ontem um novo incêndio atingiu o prédio da prefeitura municipal da minha cidade natal, Criciúma. Há coisa de duas semanas o prédio do Paço Municipal já havia queimado parcialmente. Agora o estrago foi completo e o prefeito fala que um ano e meio será o tempo necessário para recuperar a estrutura do edifício.
O comentário geral é de que o incêndio foi criminoso. Parece difícil acreditar no contrário. Diante de todas as escaramuças acontecidas pelo controle do poder político local nos últimos 15 anos, suspeitos não faltam.
Com a palavra a polícia...
O incêndio no paço, para mim, parece ter uma impressionante dimensão simbólica. Queimou totalmente o prédio disputado a ferro e fogo pelas elites políticas da cidade. Este século XXI não tem sido gentil com a antiga capital do carvão e do azulejo.
Primeiro foi a equivocada cassação judicial do reeleito prefeito Décio Goés (PT), em 2004. Aprovado pela cidade, o competente e querido arquiteto não conseguiu realizar o que planejara de bom para o município. Assumiu Anderlei Antonelli, com um período tampão do presidente da Câmara Municipal.
Em 2008 Antonelli foi atropelado pelo próprio partido, o PMDB, que acabou apresentando outro candidato nas eleições, para perder feio.
Em 2008 o candidato Clésio Salvaro se apresentou como a terceira via para superar a "imobilizadora" polarização PT versus PMDB. Ganhou e fez uma gestão que convenceu a população, tendo sido reeleito em 2012 com praticamente 80% dos votos. Uma enormidade!
Mas não pôde assumir, porque a Justiça Eleitoral entende, erradamente a meu ver, que a lei da ficha limpa está correta em atingir os oito anos pretéritos a sua edição, tornando inelegíveis candidatos condenados antes do ano de 2010, caso de Salvaro.
Salvaro era uma liderança política tão forte em 2012 que, convocadas novas eleições, elegeu seu inexpressivo vice com um pé nas costas. Como é usual na política, o vice se emancipou do criador e a ruptura entre os dois é fato notório.
O principal efeito devastador destes fatos todos ocorridos na cidade neste século é a interrupção das trajetórias de elevação das principais lideranças políticas locais. O desenvolvimento de uma cidade ocorre em paralelo com a evolução de suas lideranças políticas locais. Éramos para ter assistido oito anos de governo de Décio Goes, que teria deixado a prefeitura como grande liderança da esquerda democrática, com perspectivas claras de ocupar outros postos importantes na política estadual e nacional (imaginem as potencialidades de se ter um prefeito do mesmo partido que o presidente da República, no auge do Governo Lula). Por sua vez, Clésio Salvaro deveria estar terminando seus oito anos à frente da cidade no próximo ano, uma liderança situada no campo conservador. Estas foram as grandes lideranças políticas que a cidade gerou nestes últimos 15 anos. Lideranças fortes e autônomas, capazes de impor uma agenda: Décio Góes e Clésio Salvaro.
Com o vale-tudo da política local, ao invés da consolidação de novos líderes o que se viu foi o governo dos vices. Antonelli, vice de Eduardo Moreira, Márcio Búrigo, vice de Salvaro. Políticos sem expressão, sem projeto, sem liderança, sem vigor. Meros administradores da crise instalada definitivamente na cidade. Apenas uma pessoa ganhou com este perde-perde na política local: Eduardo Moreira e seu grupo no PMDB. Vejam que sem ganhar uma eleição no município desde 1996, o cardiologista mantém sua projeção ocupando o cargo de vice-governador do Estado. É, sem dúvida, uma façanha e tanto. Mas, notem bem: vice!
Esta crise parece que vai se alastrando pela cidade. Vejam o caso dos hospitais. Em 1998, o Fórum Para o Resgate das Dívidas Sociais já elencava a necessidade de um hospital público para uma das maiores cidades-pólo de Santa Catarina. Passadas quase duas décadas, não apenas não ganhamos um hospital público como os hospitais que existem parecem viver uma crise permanente: o hospital São José não sai das manchetes, com enormes dificuldades de financiamento. A maior construtora foi à lona deixando milhares de cidadãos no prejuízo. A universidade, patrimônio da comunidade, pela primeira vez se viu envolvida em um caso de desvio de recursos públicos (mais de R$ 700 mil, segundo seu reitor), em falcatrua tramada na conexão paço-campus, conforme apurou uma CPI na Câmara de Vereadores (dois lindos bodes expiatórios respondem agora à justiça em ação civil pública e criminalmente).
É uma agenda travada e regressiva. Com a qual os vices não conseguem romper.
Quem, como eu, esteve criança na EXPO_100, em 1980, assistindo a inauguração do complexo do Paço municipal em uma grande festividade que durou muitos dias, não pode deixar de se entristecer com a imagem do prédio monumental idealizado por Altair Guidi em chamas, consumido pelo fogo.
Oxalá este seja o último capítulo desta sequência lamentável de acontecimentos regressivos e possa nossa cidade encontrar, nas cinzas de seu edifício mais simbólico, a energia política necessária para superar este quadro desolador.
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Na verdade, Carlos, em 1996 Eduardo Moreira elegeu seu sucessor que foi Paulo Meller. Em 2000 foi eleito Décio Góes que derrotou Eduardo. Isso Moreira nunca digeriu. Em 2004 começou ... exatamente o que bem descreveste.
ResponderExcluirOLá Zurene! EStamos de acordo, não? A última eleição majoritária ganha pelo PMDB de Criciúma foi esta de 1996, em que EDuardo Moreira elegeu o Paulo Meller. Depois, nada. Abraço e obrigado pela interação!
Excluirhttps://www.facebook.com/zmanique/posts/859311987495257?pnref=story
ResponderExcluirCriciúma era uma cidade próspera até 2004 quando a ganância pelo poder se fez maior que o respeito à vontade soberana do povo que reelegia Décio Góes para o segundo mandato de prefeito.
Assim, aquele partido que está acostumado a vencer no tapetão - e mesmo quando entra de vice-presidente sua bancada joga no time da oposição - adentrou ao Paço pela porta dos fundos e o município ficou assim assim.
Em 2008 outro prefeito foi eleito e mais uma vez, aquele partido que não ganha eleição e só vence "sabe se lá de que forma", começou com mais um processo de cassação. E foi levando...
Em 2012 o prefeito foi reeleito e cassado por aquele partido que não respeita a vontade soberana do povo....
Em 2013 tivemos nova eleição para prefeito. Em janeiro de 2015 mandaram tirar o prefeito eleito em 2013 e que assumisse o que fora eleito em 2012. Em fevereiro tira o prefeito e volta o eleito em 2013.
Resumo da ópera: Criciúma virou terra de ninguém! Dois incêndios na prefeitura e fecha o pano antes que venham calar tua boca. Indignação é só o que nos resta.
Culpa de quem interferiu no rumo de nossa História lá em 2004 jogando nosso município nesse lodaçal.
Criciúma acabou. Acompanhem a expansão de Içara, o renascimento do Balneário Rincão e a prosperidade de Tubarão.
Prezado Professor Carlos Magno,
ResponderExcluirO episódio, ainda que dramático, remete a uma ideia que imaginei, e que poderíamos chamar de "o conto do servidor durante o incendio".
Seria algo assim...
Com o fogo tomando conta da repartição, e em pleno trabalho dos bombeiros, surge um servidor desesperado.
- Meu processo. Meu processo. Eu tenho que entrar!
Desviando-se dos bombeiros e seguranças, o sujeito entra pelo meio das labaredas, vai até sua mesa, avista o processo. Segura a maçaroca, sorri e joga tudo no meio do fogareu.
- Ufa. Agora sim...
É isso. Grande abraço.