São Fco.

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quinta-feira, 27 de março de 2014

Atualidade de Antígona


Há 25 séculos uma tragédia grega era escrita sobre um tema que ainda é de uma atualidade perturbadora em nosso país. Antígona, de Sófocles, narra a história de uma irmã que quer sepultar seu irmão e morre por fazê-lo de acordo com sua consciência, contra as ordens do Estado.

Seus dois irmãos lutaram em campos opostos em um confronto civil na cidade-Estado governada pelo rei Creonte. Ambos morreram, mas o rei determinou para um dos irmãos o enterro como herói e para o outro, que lutava no campo oposto, determinou a proibição do seu enterro: "que seu corpo seja devorado pelas feras!"

Antígona, irmã de ambos, inconformada com o decreto de Creonte, viola a norma e sepulta o corpo de seu irmão, Polinices. Por fazê-lo, paga com a própria vida, pois a sanção para quem violasse o decreto real era a morte por encerramento em uma caverna.

O drama narrado nestas páginas do teatro clássico grego é profundamente atual no Brasil. Completando 50 anos do último golpe de Estado, ontem a mãe de Fernando Santa Cruz, aluno da faculdade de direito da UFF no início dos anos 1970, lançou livro em homenagem à memória de seu filho desaparecido desde então. Tal como na trama de Antígona, nega-se a família um direito articulado pela heroína como "natural": cessada a luta, que os familiares possam sepultar seus mortos de acordo com seus ritos próprios.

Neste sentido, a política da ditadura brasileira de ocultar os cadáveres de quem a combatia viola preceitos jurídicos internacionais. Agiu, portanto, o Estado brasileiro à época, fora da legalidade, uma vez mais. São dezenas os desaparecidos políticos da ditadura.

Impossível não lembrar que, além  destes desaparecidos historicamente identificados, o Estado brasileiro continua a produzir dramas sofocleanos. Penso no pedreiro Amarildo, da favela da Rocinha, morto nas mãos da polícia carioca no ano de 2013. Alguma relação entre este caso e os da ditadura?

É por isso que a luta pela memória dos acontecimentos decorrentes da ditadura militar afirma com clareza: “lembrar para que não se repita”. E não continue se repetindo. Fundamental para a democracia plena que queremos construir.




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