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quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Depois das eleições




Faltam poucos dias para as eleições de segundo turno para a presidência da República. As pesquisas e o clima eleitoral  indicam uma eleição disputadíssima. Talvez a diferença entre vencedor e vencido passe pouco de um milhão de votos, o que é um placar apertado para um total de 140 milhões de eleitores. É um cenário ideal para alguém mal-intencionado que estivesse disposto a fraudar o resultado da eleição, pois um quadro onde tudo é possível torna uma fraude verossímil. Mas não há indícios sérios de que isso venha ou mesmo possa ocorrer. Mais produtivo é refletir sobre os dois cenários que hoje se apresentam como possibilidades concretas.
Aécio vence. Não será uma grande surpresa. O partido que ele integra há muito tempo é um partido que possui quadros confiáveis, preparados, acostumados à gestão pública. Pessoalmente, para ele, a presidência teria chegado precocemente. Do que vi na campanha, Aécio não está ainda preparado para um tão elevado posto, devendo passar por um período de adaptação de seus hábitos de vida imaturos para a sisudez que o cargo impõe. Certamente serão anos de uma mudança importante  na condução do Governo, pois o PSDB defende menos Estado, e isto terá muitas implicações em diversas dimensões da vida nacional. Por outro lado, por tudo que temos aprendido dela, Dilma deverá ser uma “boa perdedora”. Deverá reconhecer o resultado e desejar um bom governo a Aécio. Como não é líder partidária, deverá ser a primeira ex-presidente que agirá de acordo com a liturgia imaginada da função, podendo em médio prazo se afirmar como dotada de boa dose de autoridade moral.
Uma alteração fundamental na derrota de Dilma são as consequências da saída do PT do governo. O maior e mais consistente partido brasileiro terá uma grande oportunidade de avaliar seu papel e suas estratégias depois de 12 anos de governo. Acredito que, para o PT, seria melhor perder do que ganhar. É que nestes doze anos o movimento de evolução do partido é sempre o de perda de consistência ideológica rumo à transformação num partido tradicional brasileiro (o que quase ele já é integralmente). Seria uma ótima oportunidade de, com suas lideranças fora da gestão federal, provocar uma interrupção nesta transmutação negativa que tem consequências importantes para o processo democrático brasileiro. A derrota do PT também traria um efeito imediato: uma nova ebulição dos movimentos sociais, que se veriam imersos novamente em sua dimensão contestatória e reivindicativa em sua plenitude, sem o efeito anestésico que a presença de parceiros de luta na máquina do Estado acaba por produzir.
Dilma vence. Igualmente não será uma grande surpresa. O PT retardará em quatro anos sua autocrítica necessária enquanto partido político. Será ruim para o PT naquela supracitada dimensão mais profunda, mas será melhor para o país no meu ponto de vista. Torço para mudanças no país, mas no sentido de aprofundar o processo democrático e de diminuir as desigualdades sociais: mudar por mudar nunca é o caso. Neste sentido o Brasil ganha com mais 4 anos de PT na gestão federal. Mas o país sai rachado desta eleição.

A margem da vitória será apertada, já disse acima, mas mais que isso, a postura de Aécio como candidato de oposição insuflou a atitude antipetista reinante em parcela significativa da sociedade brasileira, em especial nas camadas superiores (superioridade em sentido econômico) da pirâmide social. Aécio tem dito que domingo será o dia da libertação, dia em que o Brasil vai se libertar do PT. Espero ansiosamente sua fala após serem publicados os resultados com a notícia da vitória de Dilma. Ele, que tem um futuro todo pela frente, bem poderia pensar como estadista e (1) reconhecer tranquilamente o resultado e (2) emitir um discurso de reconhecimento das virtudes de seu oponente. Existe muito ódio de parte a parte que emergiu nestas eleições. Cabe às lideranças de ambos os bandos em disputa jogar água nesta fervura, aplacar os exaltados ânimos.

A eleição, o processo em todas as suas dimensões, só evidenciou que o Brasil vive hoje um momento de auge de suas instituições democráticas e republicanas. A pluralidade de forças políticas que emergiu das urnas vitoriosa, assim como a ampla liberdade com que a disputa se desenvolveu em todo o país, evidenciam que a expressão “ditadura petista” não possui o menor fundamento na realidade.
A verdade é que as dimensões e a especial forma federativa que o país apresenta facilitam a acomodação das lideranças políticas das mais diversas colorações ideológicas. Como a política tradicional brasileira é muito dependente da ocupação de cargos remunerados no aparelho do estado (verdade para a direita e esquerda), o fato de que existem além da presidência da República mais 27 estados-membros e outros mais de cinco mil municípios proporciona uma situação desfavorável à degeneração do agonismo em antagonismo.  Se Aécio perde, o PSDB ainda tem São Paulo. Se Dilma perde, o PT ainda terá Minas e Bahia, para citar exemplos. É um fator que arrefece os ânimos e ajuda a manter a disputa em termos adversariais, onde o objetivo democrático é derrotar o adversário, não eliminar um inimigo.
Elio Gaspari afirmou bem: a eleição de domingo é um plebiscito sobre mais 4 anos de poder federal para o PT. Os analistas políticos têm afirmado que quando existe reeleição, o que de fato sucede é que o governante recebe um mandato de oito anos com um plebiscito na metade, para autorizar a continuar ou não. E os números mostram que a regra é a manutenção do gestor.

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