São Fco.

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sábado, 24 de abril de 2010

Doença genética impede portador de se tornar racista

Da FSP de 24 de abril de 2010

RICARDO MIOTO
ENVIADO ESPECIAL A VALINHOS (SP)

Elas simplesmente não conseguem ser racistas. São as crianças com síndrome de Williams, um transtorno genético que as deixa altamente sociáveis e alegres. "Eles acham que todas as pessoas do mundo são suas amigas", diz a neurocientista portuguesa Andreia Santos, da Universidade de Heidelberg, na Alemanha.
Esse comportamento a fez levantar a hipótese que ela demonstra agora em um novo estudo. A ausência de medo de estranhos, pensou, poderia fazer com que essas crianças fossem incapazes de tratar certos grupos raciais com características negativas estereotipadas. Depois, pôs a ideia sob teste.
Para tal, ela e seus colegas selecionaram 20 portadores da síndrome de Williams entre 5 e 16 anos e outros 20 saudáveis. Todas as crianças eram brancas e foram estimuladas a associar ideias positivas (como inteligente ou bonito) e negativas (feio ou estúpido) a imagens de pessoas de pele clara ou escura.
As crianças "normais" seguidamente associavam os bons adjetivos a pessoas brancas como elas. Para as crianças com Williams, por outro lado, a cor da pele simplesmente não fazia diferença. Elas distribuíam os adjetivos aleatoriamente, ainda que fossem todas brancas.
Segundo Santos, que publicou estudo sobre a descoberta na revista "Current Biology", provavelmente as conclusões valem também para os adultos portadores da síndrome. O que parece estar acontecendo, dizem os pesquisadores, é que quem tem o problema não possui o chamado medo social, comum entre seres humanos.
O medo social é o que ajuda a distinguir entre membros do próprio grupo e membros de um grupo estranho. Suspeita-se que essa divisão entre "nós" e "os outros" seja uma das bases psicológicas profundas dos comportamentos racistas.
Isso não significa, diz Santos, que o racismo tenha necessariamente origens genéticas e que a síndrome as apague.
"Alterações genéticas podem fazer alguém nascer sem as mãos e por isso ser incapaz de tocar piano. Mas não podemos inferir que exista uma base genética para tocar piano nesse caso", diz Alysson Muotri, biólogo brasileiro que trabalha com síndrome de Williams na Universidade da Califórnia em San Diego. "O trabalho precisa ser replicado em grupos maiores e com outras faixas etárias."

Punhado de genes
A síndrome de Williams chama a atenção por dois motivos.
O primeiro se refere ao carisma das crianças portadoras, como a menina Haila Inácio, 6, de Valinhos, no interior de São Paulo.
O outro é científico: surpreende como alterações em uns poucos genes conseguem mudar radicalmente a maneira como as pessoas se socializam. Isso porque a síndrome nada mais é do que a consequência da ausência de menos de 30 genes no cromossomo 7.
O impacto dessa ausência não se resume à amabilidade. Essas crianças costumam ter dificuldade para fazer cálculos e se orientam mal no espaço. São vulneráveis a problemas cardíacos e têm dificuldade para controlar a bexiga. Ainda assim, muitas vezes os pais demoram para obter o diagnóstico correto da síndrome.
"As mães percebem que elas têm algo diferente, mas pode demorar até que isso chame a atenção do médico. Elas têm uma face bem típica, mas às vezes passa sem diagnóstico. É uma síndrome rara", diz a médica Chong Kim, do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas. Acredita-se de, em cada 20 mil crianças nascidas, pelo menos uma têm Williams. Em comparação, a síndrome de Down ocorre em um a cada cerca de mil nascimentos.

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