Da FSP de 24 de abril
A ISLÂNDIA e um de seus vulcões têm agitado povos e continentes. Sustaram algo como 17 mil voos, retardando viagens de 1 milhão de passageiros. Criaram uma situação impensável há 70 anos, quando a Segunda Guerra Mundial mal e mal esquentava. O fato histórico explica a perplexidade dos que buscaram destinos longínquos pelo ar, sem sucesso. Há 70 anos predominavam milênios de transporte marítimo. No Brasil, ainda se pegava um Ita no norte. Portanto, perplexidade natural vinda de um país-ilha pouco maior em tamanho que Santa Catarina e com um vigésimo da população.
As lavas do vulcão e os detritos na atmosfera, com seus ventos, congestionaram aeroportos. O número de aeronaves é finito, mas retidas no solo só não perturbaram voos domésticos ao sul do Equador. Mas o que isso tem a ver com o direito? Para pergunta tão natural, a resposta parecerá exagerada: lavas e cinzas têm tudo a ver com o direito, sob muitos aspectos. É só pensar no prejuízo sofrido por passageiros, empresas, aeroportos e por toda a gama de serviços auxiliares. São bilhões, em qualquer moeda que se escolha.
A questão básica consistirá em saber quem pagará o prejuízo, mesmo que se cogite apenas de valores materiais. A resposta para tanta angústia vem em uma só palavra: ninguém. Claro que a resposta genérica é incompleta. Há seguros que se responsabilizam mesmo por motivos de força maior. Valores desembolsados por serviços não prestados devem ser devolvidos ou substituídos por serviços iguais. A causa dos danos é de força maior, conceito estritamente jurídico, do fato imprevisível, para o qual aquele que seria o devedor não deu origem.
No direito internacional, os fatos danosos oriundos da natureza não são indenizáveis. No Brasil, a regra geral exclui a responsabilidade do devedor de uma obrigação nascida de danos ou prejuízos resultantes de caso fortuito ou de força maior. Esses dois tipos descrevem situações do direito das obrigações, nas quais há fato necessário e cujos efeitos não era possível evitar ou prevenir. É o que está escrito, quase nas mesmas palavras, no artigo 393 do Código Civil de 2002 e citado mais de uma vez nesta coluna.
Pensando nas companhias aéreas, é evidente que os detritos lançados na atmosfera não são previsíveis ou evitáveis. Ampliando a cogitação, para saber se o governo da Islândia seria responsabilizável, a resposta negativa subsiste. Nem sempre, porém. Quando for evidente que o poder público deveria prever que certas ações ou omissões poderiam dar causa a danos, passa a responder pela inércia.
No Brasil, lembramos as grandes chuvas dos últimos meses. Se demonstrado em juízo que a inundação de certa via pública foi agravada pelo cuidado omitido ou insuficiente do município, do Estado ou da União, a responsabilidade pode ser cobrada. Verdade é que o Poder Executivo no Brasil não dá maior atenção para essa responsabilidade, pois são poucos os que a cobram e, quando cobram, o Poder Executivo faz de tudo para retardar o pagamento, mesmo quando confessou o débito.
Furacões, terremotos, tempestades de neve, trombas-d'água e explosões vulcânicas são fatos da natureza. Ela tem suas leis. Quando acorda, o efeito é doloroso, mas não indenizável. A lei das lavas é impiedosa.
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